Aproveitei os dias de praia para ler. Desfrutar de publicações dos últimos anos e reler também. Algumas obras, de aventuras, inicialmente escritas para um público juvenil. Pepe Carbalhude, O talismã dos druidas; Rafael Lema, O capitam Aranha. São novelas que, eu parece-mo, desfruto muito melhor agora e desde logo recomendo para um público mais experimentado, capaz de entender a ‘literatura séria’. Da que também gosto, claro. Como a de Rosa Aneiros, Resistência, um relato que atende particularmente o terceiro terço do século XX em Portugal, uma novela total, do melhor que li em muito tempo. Ou Bieito Iglesias, histórias pouco pretensiosas, para um público ao melhor muito particular e mais local, com um estilo que chega a um humor excepcional: gostei imenso, não é um humor instalado na narração, em sucessos e peripécias engraçadas de seu (como por exemplo Romaxe de desventuras de Carbalhude que muito me fez rir este verão), não: é converter as frases, a expressão per se, num motivo que desperta o sorriso. Não conheço ninguém, hoje, quem de escrever como o Bieito Iglesias desde a fala galega.
Todas estas novelas estão escritas sem se adaptarem ainda ao Acordo Ortográfico: posso compreender o motivo ainda que, na grande maioria dos casos, sinto bem não poder comparti-las melhor com todos os demais falantes do nosso idioma no mundo, de Carvalho a Lisboa, de Luanda a Aveiro, de Dili a Rio de Janeiro.
E assim, antes de que começara a chover, com sol mas já em Outubro, fui também ao teatro ver uma adaptação de Alice in Wonderland do Teatro de Marionetas do Porto. Vieram amostrar o seu espectáculo a Carvalho de Bergantinhos. Sai tão impressionado que cuido que botei duas horas a falar apenas de teatro e literatura com distintos amigos (e amigas: obrigado a Olga, só o seu nome sei, por me acompanhar a derradeira até as 6:00AM e vir comigo mesmo a uma sessão de música tecno!). Tenho de reler, ler de novo, agora em original, Alice in Wonderland. ‘E Alice no país do espelho!’ disse-me Paula Carbalheira, excelente actriz e escritora, das primeiras pessoas com quem bati ao sair do teatro. Apreciei novos aspectos da obra de Lewis Carrol que nem imaginava.
‘Satori!’ Pensei, quero dizer senti, várias vezes, movendo-me cara adiante no assento como querendo entrar ainda mais na representação. Essa revelação do momento que a arte -não tão frequentemente- nos dá.
Levo um tempo no que tão bom como a surpresa da novidade e a compreensão do contemporâneo é achar aquilo que já estava ai, pelo que passaste se calhar há muitos ou já faz bem uns anos, ao melhor mais recentemente mas à pressa de mais, sem parares o preciso.
Levo um tempo em que entender é descobrir que naquilo que já conhecias fica ainda tanto, quase tudo, por descobrir.